Ao
chegar ao chalé encontrou Augusto esticado no sofá twitando e actualizando o
seu feed do facebook. Anselmo preparou-lhe a canja o melhor que soube. Coseu
muito a massa e as carnes e no final juntou-lhes um bom fio de azeite e hortelã
do jardim para dar sabor. Serviu o prato
e tratou de ir arrumar a cozinha.
Augusto
encontrava-se bastante melhor da sua enfermidade desde que soubera que tinha a
ligação à internet de alta-velociade estava finalmente instalada. Todo o tempo
que Anselmo demorara a impressionar a aldeia com as sinfonias classicas dos
grandes mestres foi passado pelo novo inquilino do chalé a discorrer nos seus
blogs de opinião. As possibilidades de interacção mundial permitidas pelo
simples toque dum dedo eram para ele como uma montanha-russa vertiginosa.
*Clique* Comprou aquele livro raro que andava a regatear no e-Bay. *Clique*
Postou essa compra simultâneamente no Twitter e no Facebook. Em alguns segundos
já tinha likes e coments de inveja e admiração. *Clique* Aceitou num pedido de
amizade que tinha pendente. *Clique* Entra na visita virtual do Louvre, na
plena comodidade da sua poltrona. *Clique* Visiona os dividendos dos seus
investimentos. *Clique* Participa naquele concurso de fotografia. *Clique*
Confirma a proxima viagem à Tailândia. *Clique* *Clique* *Clique* *Clique* *Clique* *Clique* *Clique* *Clique* *Clique*
*Clique* *Clique* *Clique* *Clique**Clique**Clique* *Clique**Clique* *Clique**Clique**Clique*
*Clique*.
E tudo isto ao
magnifico som de Caetano Veloso na sua interpretação da Paloma. Entretanto Ana
informara-o que ia para a Martinica com Nuno e que só o poderia visitar daí a
duas semanas, mas que não se preocupasse porque o hotel tinha wireless em todos
os quartos e ela levava algum trabalho para fazer, de modo que estaria sempre
on-line. De resto isso pouca importancia tinha para Augusto, porque nessa noite
já tinha marcado um jantar à luz do ecran com uma outra amiga que conhecera na
blogosfera. Do canto do da cozinha Anselmo reparava em tudo. Parecia-lhe o seu
senhor passava demasiado tempo sentado agarrado aquele seu ecranzito portatil
que usava para tudo. Quando foi levantar a canja aproveitou para meter a
colher:
- Ó Senhor Augusto, não me leve a
mal, mas quer-me cá parecer que o Senhor passa demasiado tempo aqui em casa sem
sair. Então não é que esteve todo este tempo sentado a mexer nesse seu portátil
sem nunca levantar os olhos das letras, nem para ver o magnifico pôr-do-sol que
esteve? Eu acho que o Senhor devia sair e apanhar mais ar, conviver mais com as
pessoas. Afinal que bem lhe faz vir para o campo e passar o dia sentado num
sofá? Para isso ficava na cidade, que aqui deve-se é sair e apanhar ar,
conviver!