6.7.12

Testemunho: o novo-riquismo ecológico e social


     Adoro causas nobres, muito mais do que imaginas. Não sei se já te contei (nem todos precisam de saber) que sou uma pessoa de bem.

Já plantei uma árvore; esteja ela viva ou morta, o que interessa é a intenção, até porque vi o presidente da câmara a plantar a primeira, e mal seria se eu, como SIDAdão, não plantasse a minha.

Também já mandei aquela roupa (de odores astringentes e cores folcloricamente berrantes e pindéricas) para os putozinhos em África. Talvez eles apreciem, porque me ofende a vista e, desde que vi as colecções Outono-Inverno na Vanity Fera, deixou de me servir.  Nem sei porquê, a verdade é que eu nem engordei.

reciclaije tem em mim um grande adepto. Perguntei ao energúmeno do lixo para onde ia o frasco de foie gras. Ele ficou indeciso, coitado, e disse-me para ir ler o Manual. Agora ponho tudo no sítio certo, até a Ignorância, que tem de ter sítio para onde ir. Mais ainda: passei a comprar embalagens mais pequenas de sumos, champôs e cremes para a pele: quanto mais coisas tiver e mais cheio e pesado estiver o saco, então isso quer dizer que reciclo mais e tenho uma atitude mais proactivamente amiga do ambiente. Pelo menos é o que os meus vizinhos vão pensar. E nem pensar em arranjar coisas, que isso passou de moda.

É claro que já adoptei muita coisa. Davam-me sempre uma t-shirt ou uma mascote. Essas guardo sempre. Também me pediram para adoptar um cão, uma flor ou uma criança, mas isso ia ser uma chatice, porque ia conspurcar a casa.

Adoro crianças. São todas umas queridas. Quando sorriem ficam bem em qualquer fotografia, independentemente do credo, côr ou religião. É por isso que, qualquer iniciativa que as envolva conta com a minha ajuda. Principalmente se tiver Sorriso algures no seu nome. Crianças tudo bem, mas não tenho jeito nenhum para dar apoio a idosos! Isso deve ser da conta da Santa Casa da Misericórdia ou dos lares e centros de Dia, que são imensos. Também não é preciso chegar ao ponto de pôr os "Velhos no Velhão", como diziam os Gato Fedorento, num sketch genial feito em tempos. É claro que não! Mas compreendam-me: eles só se queixam. Também não têm ideias de futuro. Prefiro respeitosamente tratá-los por idosos em vez de velhos.

Finalmente, devo dizer que temos de ser felizes e aproveitar todos os momentos como se fossem os últimos. E torná-los especiais. E um momento é especial quanto mais caro for. A comida, claro está, não pode ter ossos, espinhas, caroços, casca ou côdea. Quanto ao lazer, posso dar tacadas, mas tem de ser num green, que esteja verde o ano inteiro, faça chuva ou faça seca.  Nem que se sequem todos os rios de Marrocos. Andar a pé só com bastão e com o patrocínio de uma marca de ténis mínimamente decente, porque os calos não fazem parte da vida.

Sou uma pessoa de gostos simples, mas ainda assim deixo que me impinjam todo o tipo de objectos que, mais ou menos úteis, dão-me todo o status de que preciso. Mesmo que correspondam a desperdícios de recursos, porque ao menos assim a economia desenvolve. E espero não ficar cá para ver o mundo daqui a duas gerações.