24.5.12

Carta Aberta ao Cidadão


Estimado leitor/consumidor,

Obrigado pela sua colaboração. Tem-me sido imensamente útil desde que, legítimamente, alguém conseguiu degolar o rei de França. A partir desse dia, pelo menos nesse país, todos os cidadãos passaram a ser iguais perante a lei. Cessaram os religiosismos fanáticos e a nobreza ociosa.

Tem-me sido útil, caro consumidor, por ser tão livre e tão feliz. Pela casa descomunal, pelo carro veloz, pelos seios maiores, pelo emprego (ainda que precário), pelo ar (ainda que condicionado), pela água cristalina (ainda que engarrafada) e pelas paisagens naturais únicas (ainda que já só estejam disponíveis em óculos 3D). No caso de não contribuir para a felicidade, o seu país fa-lo-á por si. Nem que, para mantê-lo feliz, tenhamos de penhorar alguns bens que lhe são fúteis e o seu governo democrático perca a soberania.

Se sentir alguma cólera temos medicamentos, viagens e psicólogos para si, sob condições únicas de financiamento. Não adianta produzir: na China farão por si. Não adianta protestar: os jornais são imparciais e são financiados por nós. Não adianta manifestar-se:  temos para si uma rede social, tão rica em aplicações, quizzes e grupos proactivos que V. não conseguirá focar-se NUMA causa pela qual sonhar ou lutar. Também não adianta, claro está, exaltar-nos em cartas como esta, escrever nos jornais ou usar a liberdade de imprensa pois o nosso poder não tem rosto.

A falta de emprego e o facto de V. andar a consumir pouco preocupa-nos. Mas, por favor, não deixe de nos ficar a dever.