19.3.12

Thumbs up!

     Confesso que tenho sido assediado: onde quer que me dirija, no mundo real, no mundo virtual ou no universo paralelo, há sempre um polegar azul que acena. E, claro está, é difícil resistir ao seu poder. Fazer like tornou-se num ritual, ainda que seja sobre um estado de espírito, um momento confessional, um "tive insónias" ou "está numa relação". Haverá mesmo quem se disponha a dessacralizar a vida privada para merecer uns likes! Pois bem, tal como o cavaleiro das cruzadas era capaz de morrer para matar um sarraceno, hoje tudo se faz por um polegar. É talvez a religião que mais crentes tem gerado nos últimos tempos. Pelejar o mouro? Jamé, ganha gostos e terás glória!

Que o polegar é poderoso, todos sabemos. Já vi corporações inteiras a ombrearem-se por gostos, usando pretextos como almoços e gelados à borla... Mas este fetiche também gera medo e calafrios, algo que já Maquiavel imaginava. Não era este autor que defendia que, se tivermos de escolher entre sermos temidos ou amados, devemos querer ser temidos? Pois assim é com o polegar. Quantas empresas retiram comentários considerados foleiros, não fosse o polegar beliscar a imagem. Depois vão-se queixar de censura, esses sacanas... E já que se toca neste assunto, o polegar arroga-se de conseguir derrubar ditadores e caçar infiéis. É mesmo assim; o nosso amigo Mark Zuckerberg até foi premiado (pasme-se) pelo FBI na condição de inventor do polegar, por dar informações sobre o paradeiro de uns rebeldes na Líbia, que terão sido chacinados logo a seguir.

O polegar é poderoso e traz sangue. Consta que se pode matar uma pessoa com um polegar. Ou muitos. Ou será que já ninguém se lembra do wrestling da antiguidade? Ao menos os romanos eram evoluídos, uma vez que conseguiam manifestar-se ao ponto de não gostar do comportamento de um escravo perante as feras. Mas o nosso caro Zuckerberg não nos dá essa liberdade. Não surpreende, pois, que o polegar seja sarcástico, numa degeneração não planeada. Senão veja-se: quando alguém partilha um vídeo sobre a fome no Sudão ou aos prodígios vocais e coreográficos do Telmo Miranda e queremos mostrar atenção, ou gostamos, ou comentamos. É claro que todos gostamos da imagem de satélite com o oceano Ártico sem gelo estival, com os carneirinhos das ondas como único branco. Gostamos não gostando, penso eu de que...

Last but not the least, o polegar é o culminar do criacionismo, numa forma de "Gostai e multiplicai-vos" e, simultaneamente, do evolucionismo. Senão veja-se: o polegar é o dedo (ou quirodáctilo) mais importante dos hominídeos – é completamente distinto dos outros dedos, o que significou uma aquisição evolutiva que permitiu a estes animais a utilização de instrumentos. O dedo também ajuda à defesa ou à modificação do meio ambiente (Edgar Morin, em "Paradigma Perdido" refere-se à dialéctica "pé - mão - cérebro").

O polegar faz obra, mas será que o seu sucedâneo virtual muda o meio ambiente? Ou, reformulando a pergunta, o que farão 7.000.000.000 likes? Será que, enquanto gosto do vídeo do Kony, no meu sofá, estarei a interferir na causa? Sim, é uma forma de activismo simples e apelativa. Apenas requer a quantidade de calorias que nos permitem levantar o dedo e premir o botão esquerdo do rato (para quem usa Windows). Like, and share, on and on...
O polegar é poderoso e mortífero, temido e respeitado, honesto e sarcástico. Thumbs up, gostem e serão salvos!